Tribunal de Contas do Estado do Paraná

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Ex-secretário estadual da Fazenda recebe 3 multas por cancelar empenhos em 2015

Sede da Secretaria de Estado da Fazenda do Paraná, ...

O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) julgou irregulares , em relação à Secretaria de Estado da Fazenda do Paraná (Sefa), o cancelamento de empenhos não liquidados e já liquidados no exercício de 2015, referentes a despesas de caráter continuado; o cancelamento de restos a pagar de exercícios anteriores, em 2015, com a subsequente inscrição em Despesas de Exercícios Anteriores (DEA) em 2016; e no reconhecimento como DEA, em 2016, de valores relativos a despesas efetivadas e não empenhadas em 2015.

Em razão da decisão, o titular da Sefa em 2015, Mauro Ricardo Machado Costa recebeu três multas que totalizam 120 vezes o valor da Unidade Padrão Fiscal do Estado do Paraná (UPF-PR). Em novembro, a UPF-PR vale R$ 101,32; e o valor total da sanção corresponde a R$ 12.158,40 para pagamento neste mês.

Os conselheiros decidiram em Tomada de Contas Extraordinária instaurada em cumprimento a determinação do Acórdão de Parecer Prévio nº 223/16 do Tribunal Pleno, relativo à Prestação de Contas do Governador de 2015, com o objetivo de apurar a responsabilidade do ex-secretário em relação às irregularidades referentes a cancelamentos de empenho, restos a pagar e despesas não empenhadas.

A Coordenadoria de Gestão Estadual (CGE) do TCE-PR, responsável pela instrução do processo, concluiu pela irregularidade das contas tomadas, com a aplicação de três multas ao ex-secretário. O Ministério Público de Contas (MPC-PR) concordou com a unidade técnica.

 

Legislação

As irregularidades constatadas ofendem os dispositivos legais listados abaixo.

Artigo 50, II, da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF - Lei Complementar nº 101/2000), que estabelece o Princípio da Competência para o registro das despesas, em conformidade com o artigo 9º da Resolução nº 750/93 - alterada pela Resolução nº 1.282/10 - do Conselho Federal de Contabilidade (CFC).

Artigo 60 da Lei nº 4.320/64 (Lei do Orçamento Público), que veda a realização de despesa sem prévio empenho, corroborado pelo artigo 15; combinado com os artigos 16, parágrafo 1º, I, e parágrafo 4º, I; e 17, parágrafo 1º, da LRF, que estabelecem, além da obrigatoriedade do prévio empenho e da previsão orçamentária, a demonstração da origem dos recursos para custeio de despesas continuadas.

Artigo 37 da Lei nº 4.320/64, que estabelece as condições para o reconhecimento de despesas apuradas como DEA.

 

Cancelamento de empenhos de despesas de caráter continuado

Além do cancelamento do empenho de R$ 6.110.000,00, referente à despesa com os Correios para o envio dos boletos do Imposto Sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de 2016, que efetivamente ocorreu no mês de dezembro de 2015, foram cancelados, em 31 de dezembro de 2015, diversos outros empenhos não liquidados relativos a despesas continuadas, no valor total de R$ 26.164.929,95.

Costa sustentou que o cancelamento das despesas não liquidadas do exercício de 2015 e anteriores foi realizada em observância ao Decreto Estadual nº 2.879/2015 e à Resolução nº 1.278/2015 da Sefa, que disciplinaram o estorno automático de empenhos que ultrapassassem o período de cinco anos e daqueles cuja manutenção não fosse justificada pelas unidades responsáveis.

A CGE ressaltou que o fato de terem sido adotados procedimentos formais estabelecidos em decreto e resolução não afasta a conclusão de que efetivamente houve o cancelamento indevido de empenhos de despesas de caráter continuado.

O conselheiro Iven Linhares, relator do processo, lembrou que essas despesas, cujo fato gerador já havia ocorrido e cuja fase de processamento já havia sido iniciada, jamais poderiam ter sido canceladas de modo automático e indiscriminado.

 

Cancelamento de empenhos já liquidados

Houve o cancelamento, em 31 de dezembro de 2015, de empenhos liquidados - cuja entrega de mercadoria ou prestação de serviço se deduz efetivada -, relativos a despesas continuadas, no valor total de R$ 25.898.877,75.

A defesa alegou que o cancelamento foi necessário em razão da reorganização da estrutura do Estado - fusão ou cisão de órgãos, mudança da natureza dos fundos de que trata a Lei nº 18.375/14 e reorganização da estrutura contábil da Universidade Estadual do Paraná (Unespar).

A CGE afirmou que houve o cancelamento de vários empenhos de órgãos e entidades que não sofreram modificações em suas estruturas e que, inclusive, são de caráter continuado; e destacou que não foi apresentada justificativa plausível para o cancelamento das demais despesas, no valor total de R$ 24.961.922,99.

Além disso, a unidade técnica ressaltou que os compromissos de pagamentos assumidos pela administração pública não podem ser cancelados, salvo se for cancelada também a obrigação correspondente junto ao credor, ou seja, se não houver mais a dívida por devolução de materiais ou outros motivos semelhantes; ou ainda, quando necessárias alterações nos dados do empenho ou liquidação.

O relator frisou que a tese de que o cancelamento dos empenhos teria ocorrido de forma regular pelo simples motivo de ter atendido a normativa infralegal jamais poderia ser aplicada à irregularidade, que se refere a empenhos liquidados, não abrangidos pela normativa invocada.

 

Cancelamento de restos a pagar, com a inscrição em DEA

Três empenhos referentes ao Programa Luz Fraterna relativos a restos a pagar dos meses de janeiro, fevereiro e maio de 2011, cujo credor é a Copel Distribuição S.A., foram cancelados em 2015 e novamente empenhados em 2016. Diversos outros cancelamentos referentes a esse programa apresentaram situação semelhante, apesar de não terem sido reconhecidos como DEA, no valor total de R$ 22.298.463,07.

A defesa alegou que a parcela de empenhos reconhecidos como DEA no primeiro quadrimestre de 2016 - R$ 218.354.000,00 - é ínfima em comparação ao total dos estornos realizados em 2015 - R$ 3.968.500.000,00 -; e que parcela significativa se refere a despesas reconhecidas por outros poderes - cerca de R$ 60 milhões.

Costa sustentou, ainda, que o estorno de empenhos seguiu procedimento previamente estabelecido; e que não havia espaço de reserva orçamentária para emissão de empenho e liquidação sem a devida comprovação da entrega do bem ou da execução completa do serviço prestado.

A CGE destacou que as próprias justificativas apresentadas pelo Governo do Paraná na Prestação de Contas do Governador de 2015 reconheceram que as despesas relativas ao Programa Luz Fraterna foram atestadas e liquidadas. A unidade técnica afirmou, ainda, que diversas despesas de exercícios anteriores já tinham as respectivas notas fiscais emitidas e, mesmo assim, tiveram os seus empenhos cancelados e foram posteriormente inscritas em DEA.

Linhares deu razão à CGE quanto à irregularidade, apesar de a defesa considerar os valores ínfimos em face do total de estornos realizados em 2015, pois foram inscritas em DEA despesas correspondentes ao cancelamento indevido de restos a pagar, inclusive processados e com notas fiscais emitidas.

 

Reconhecimento como DEA de despesas não empenhadas

Houve o reconhecimento de diversos valores como DEA em 2016, relativos a despesas de caráter continuado amparadas em contrato, efetivadas em 2015 e não empenhadas, que totalizaram R$ 21.413.578,44.

A defesa não se manifestou a respeito desta irregularidade. A CGE indicou outros casos de reconhecimento em DEA em 2016 de despesas cujo empenho não foi identificado em 2015, conforme informações do Caderno de Gestão Orçamentária, Financeira e Patrimonial do Estado do Paraná.

 

Defesa

Costa elencou a conjuntura econômica e financeira da época; a necessidade de utilização dos recursos de modo consciente e responsável; e a ausência de espaço para reserva orçamentária. Ele justificou que foram cumpridas as diretrizes estabelecidas em decreto e resolução para a manutenção dos empenhos e que houve estorno automático apenas nos casos em que não foi possível comprovar a existência documental da despesa.

O ex-secretário defendeu que a prática não configurou ilegalidade ou prejuízo ao cofre público; e que a anulação de despesas que não representam compromisso com os interesses maiores da administração pública libera orçamento e recursos financeiros para as áreas prioritárias, como saúde, educação e segurança pública. Ele afirmou que a medida foi necessária para o equilíbrio das contas e a destinação de recursos suficientes para as áreas mais importantes.

Finalmente, o ex-secretário concluiu que não houve responsabilidade pessoal sua e que somente cumpriu a legislação vigente.

 

Decisão

O conselheiro do TCE-PR afirmou que o procedimento estabelecido pelo Secretário Estadual da Fazenda na Resolução nº 1.278/2015, além de ser falho, foi executado de forma inadequada e ampliado para abranger despesas processadas, levando ao cancelamento indevido de empenhos de despesas continuadas e de restos a pagar de exercícios anteriores. Ele ressaltou que não pode ser admitido o cancelamento automático e indiscriminado de empenhos referentes a despesas continuadas, cuja entrega dos bens ou execução dos serviços correspondentes, por ser habitual e ininterrupta, deve ser presumida.

Linhares sustentou que a falha é ainda mais grave no caso dos empenhos liquidados, pois a administração pública já certificara o adimplemento da obrigação de entregar ou de fazer. Ele frisou que esses empenhos somente poderiam ser cancelados em casos de excepcional gravidade e de forma devidamente justificada, jamais de maneira automatizada e indiscriminada.

O relator destacou que, em ambos os casos, as consequências são a inadimplência da administração perante os credores e os ônus dela resultantes, como a incidência de juros e multas decorrentes da mora no pagamento; além da possibilidade de quebra de contrato, do enriquecimento indevido do poder público e da exposição da administração e dos seus gestores a sanções legais de diversas naturezas.

O conselheiro afirmou, ainda, que houve desvinculação de diversas despesas dos exercícios em que ocorreram, seja por meio do cancelamento indevido de empenhos e de restos a pagar, ou por meio do não empenhamento de despesas no exercício em que ocorreram, com inscrição em DEA no exercício seguinte. E concluiu que, além de manifestamente ilegais, essas práticas interferiram na apuração do resultado orçamentário do exercício de 2015, com reflexos nos respectivos resultados patrimonial, financeiro e fiscal, em possível burla às limitações orçamentárias e fiscais impostas pela Constituição Estadual e Federal - limites nas áreas de Saúde, Educação e Ciência e Tecnologia -, pela Lei nº 4.320/64 e pela Lei Complementar nº 101/2000.

Linhares concluiu que teria ocorrido atuação deliberada, no intuito de fabricar resultados mais favoráveis para o exercício de 2015, em detrimento do efetivo equilíbrio das contas públicas.

Finalmente, o relator considerou que a reprovabilidade da conduta do ex-secretário é agravada pelo fato de que a ilegalidade nos cancelamentos de empenhos e de restos a pagar repetiu-se, ao menos no exercício de 2017, apesar de Costa ter sido alertado a esse respeito. Assim, ele aplicou ao responsável, por três vezes, a multa prevista no artigo 87, IV, "g", da Lei Complementar Estadual nº 113/05 (Lei Orgânica do TCE-PR).

Os conselheiros acompanharam o voto do relator por unanimidade, na sessão do Tribunal Pleno de 24 de outubro, e determinaram que seja dada ciência da decisão à atual governadora, Maria Aparecida Borghetti, para que se abstenha das práticas julgadas irregulares. Os prazos para recursos passaram a contar a partir do primeiro dia útil seguinte à publicação do Acórdão nº 3152/18 - Tribunal Pleno, na edição nº 1.939 do Diário Eletrônico do TCE-PR, veiculada em 30 de outubro.

 

Serviço

Processo :

160581/18

Acórdão nº

3152/18 - Tribunal Pleno

Assunto:

Tomada de Contas Extraordinária

Entidade:

Estado do Paraná

Interessados:

Mauro Ricardo Machado Costa e Secretaria de Estado da Fazenda

Relator:

Conselheiro Ivens Zschoerper Linhares

 

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